Um imóvel é um bem de valor económico elevado que tem um período de rotação lento e envolve um processo de decisão complexo e ponderado. Mesmo assim, na maioria dos casos, não deixa de estar associado a uma decisão emocional.
Por ser um bem de absoluto significado e de primeira necessidade para qualquer pessoa, há desejos e emoções fortes envolvidas. Mas a verdade é que, geralmente, não é uma compra de impulso, ou não deveria ser.
Necessidade ou desejo?
De facto, compramos pela emoção e, por isso, o desejo é uma das constantes deste processo de decisão que adquire um peso enorme. No entanto, devido a todo o processo financeiro e burocrático envolvido e, principalmente, devido à impossibilidade de troca lenta e custosa no caso de uma decisão errada, a necessidade sobrepõe-se ao desejo.
Assim sendo, o processo de decisão de compra de casa pondera a necessidade de:
– Morar perto de… (localização/serviços);
– Precisar de mais ou menos espaço… (área / divisões);
– Mudança na vida pessoal … (relações, separações, nascimentos, morte);
– Mudança na vida profissional… (novos desafios, nova localização, despedimentos, teletrabalho…).
As necessidades que despoletam e influenciam estas mudanças de vida são muitas e podem ser postas em prática com um maior ou menor grau de urgência e planeamento, sendo que existem muitas situações na vida que exigem reação por não serem planeadas.
Depois, chega talvez a parte mais emocional, a parte ligada ao desejo sobre as características do produto imobiliário, neste caso, da casa que muitas vezes se confunde com necessidades:
– Desejo de viver numa determinada zona;
– Desejo de ter uma casa maior ou mais pequena;
– Desejo de ter uma casa mais recente, em melhor estado, mais bem acabada e dividida, mais sustentável;
– Desejo de ter vista, varandas, terraços, garagens, parqueamentos, entre outras características.
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Imóveis não têm talão de troca
Se juntarmos a isto o desejo de posse de um bem, mesmo não resolvendo nenhuma necessidade ou problema objetivo, satisfazemos o prazer de possuir. É aqui que o desejo se manifesta muitas vezes de forma mais forte, e é perante esta perceção que algumas pessoas são levadas a decidir por impulso, ou melhor, agir e decidir sem pensar de forma racional.
Poderia dar aqui uma série de exemplos, como um dos casos com que tive de lidar de uma senhora que queria uma vista rio e escolheu ignorar o 4º andar sem elevador, colocando a casa à venda meses depois. Mas o desejo é de cada um, e quando se torna uma convicção é, por vezes, difícil de argumentar.
O produto imobiliário é complexo, tem também um valor elevado e é fixo, o que quer dizer que não é transportável e também não é descartável. Na maior parte dos casos, não se pode experimentar e depois tomar a decisão de adquirir ou não.
O produto imobiliário é também um produto único, ou seja, por muito parecido que seja, não há imóveis iguais, o que pode até criar algum stress na pessoa que compra, no sentido de um eventual sentimento de perda em situação em que tem de escolher e decidir rapidamente. Aliás, o marketing imobiliário joga muito com esta tática persuasiva da escassez. Porém, a eficácia esbarra no preço elevado e no processo burocrático lento.
A compra é muitas vezes condicionada por uma decisão externa e não controlável, o financiamento. Ao contrário de outras compras, um financiamento imobiliário não pode ser aprovado em minutos, pode demorar largos dias para decisão e obtenção de uma resposta definitiva e aprovada.
Há ainda o processo burocrático da mudança de propriedade para o novo proprietário que, apesar de alguma evolução nos últimos anos, continua complexa, lenta e com centenas de papéis dispersos por várias entidades, o que o torna um processo pouco sustentável.
Por fim, e como referi anteriormente, não há talão de troca, ou seja, depois da escritura, a única forma de se voltar a desconsiderar a compra efetuada será a de vender o imóvel recentemente comprado, sem nenhuma garantia de recuperar o valor investido, nem de controlar o tempo que poderá demorar a transação.
Quando um potencial comprador se aventura na compra de um imóvel, pode até iniciar a sua decisão como uma decisão por impulso. No entanto, o processo faz despertar a racionalidade e dois grandes medos: medo de se enganar, e medo de ser enganado.
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Que soluções?
Uma das evidentes soluções seria o arrendamento, o qual, ao contrário da compra, permite uma maior flexibilidade e rapidez na escolha do bem imóvel e também na eventual troca. Para além do mais, o valor é menor pois apenas se contabiliza a utilização do produto e não a sua aquisição. Pode ainda ser uma vantagem para teste de uma decisão de compra mais à frente.
Infelizmente, em Portugal, o mercado de arredamento é escasso, desregulado e precário, o que, com alguma naturalidade, acaba por empurrar para a compra muitas pessoas que necessitam de habitação, e afastar investidores que gostariam de obter um bom rendimento.
Há ainda outra solução, o potencial comprador não se aventurar nesta compra sozinho e procurar ajuda de um profissional de mediação imobiliária que o possa aconselhar de forma honesta e ética zelando pelos seus interesses e prestando assim um bom serviço. Mas, muitas vezes, neste mercado, encontrar este profissional não é uma tarefa fácil!
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