Analiso mercados, projetos, marcas e profissionais de mediação imobiliária todos os dias e posso dizer que o mercado norte americano é o mercado mais evoluído do mundo.

Para além de ter trabalhado em duas das maiores marcas fundadas neste mercado que estão presentes em Portugal há anos, e sempre em posições de liderança, observo a evolução de perto online e pelo menos uma vez por ano quando viajo com o propósito de saber o que há de novo.

Hoje, felizmente há muita informação e possibilidade de networking remoto que me permite não ter que me deslocar constantemente para perceber que realmente, e em conjunto com o Canadá, os Estados Unidos são sem sombra de dúvida o mercado mais evoluído neste setor. Contudo, outros países têm evoluído de igual forma e até a um ritmo mais rápido, pois os profissionais modelam e adaptam as boas práticas e modelos já existentes que funcionam há anos.

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E Portugal?

Depois de muitos anos de análise contínua e trabalho com vários players do sector, verifico que as grandes diferenças entre o mercado norte-americano e o português não estão propriamente nas técnicas e táticas que se utilizam, nem até nas estratégias de marketing. Existem 3 pilares estruturantes e muito mais fortes que impactam e que considero como os que realmente fazem a diferença entre um país e outro.

1. Mindset

A sociedade e escola norte-americana têm a tradição de construção de mindsets empreendedores, o empreendedorismo é uma via muito vincada ao contrário do que se cultiva em países europeus e por conseguinte, em Portugal. Sabendo que quase a totalidade dos agentes imobiliários em Portugal são ENI (Empresários em Nome Individual) é desafiante e fácil perceber porque existem tantas dificuldades na gestão do mindset e principalmente, da sua atividade, que muitas vezes deixa de ser apenas uma atividade e passa a ser um autêntico negócio.

A gestão financeira, fiscal e a definição de caminhos estratégicos de inovação, marketing e recursos humanos em muitos casos passam a ser pilares vitais para o sucesso e desempenho de qualquer pessoa ou projeto nesta área. Por exemplo, ainda hoje em Portugal, assiste-se a pessoas a querer entrar nesta atividade com um mindset de empregado, pensam em valores ou ordenados fixos, horários de trabalho e fins de semana e feriados livres, quem empreende sabe que este mindset reduz o potencial de qualquer projeto, e não se trata de trabalhar mais, trata-se de fazer o que é necessário de forma eficaz. Enquanto esta forma de pensar não for mudada, será muito difícil o mercado igualar o que são hoje resultados e negócios no mercado norte-americano.

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2. MLS

MLS ou Multiple Listing Services, é uma das grandes diferenças entre a transparência e acesso a dados do mercado norte-americano quando comparado com o português. Nos Estados Unidos, o MLS existe há mais de 100 anos como um sistema de partilha de negócio entre empresas e agentes imobiliários credenciados, hoje com uma tecnologia cada vez mais adaptada, esta partilha é feita de forma simples, automatizada e com elevado rigor, o que traz enormes vantagens a quem atua no imobiliário:

  • Transações mais céleres, seja para quem compra como para quem vende;
  • Mais e melhor informação para o mercado;
  • Aumento substancial da quota de mercado da mediação imobiliária face às transações feitas entre particulares;
  • Melhor serviço ao cliente, capacitando uma transação mais rápida e com maior segurança de informação e processos transparentes;
  • Mais transparência, mais dados, melhor discernimento de decisão em relação a todo o processo de transação.

E porque não existem mais sistemas de MLS em Portugal (e na Europa em geral)? Os poucos que existem não funcionam no seu maior potencial pela simples razão de que grande parte do mercado europeu trabalha em regime aberto. No caso específico de Portugal, em 2018 estimava-se que mais de 80% das empresas trabalhassem em regime aberto, regime contratual que não permite a segurança da partilha da informação e do negócio e faz com que o comportamento dos profissionais seja de concorrência agressiva e não de parceria.

Para termos uma noção dos níveis de serviço que podemos atingir aqui, deixo-vos com a quota de mercado da mediação nos Estados Unidos: 93% deste mercado recorre a serviços de mediação imobiliária, e não por imposição, é mesmo porque reconhece o valor que este serviço lhes aporta.

3. Regulamentação

Para que qualquer atividade seja reconhecida e trabalhe de forma eticamente correta, terão de existir regras e muito além da legislação, será necessário um código ético que separe o trigo do joio, ou se quiser, o profissional do amador.

Sem dúvida que a legislação portuguesa atual fica muito aquém da norte-americana, e além disso, a falta de fiscalização também faz com que tudo, ou quase tudo, seja possível na mediação imobiliária, criando espaço para quem escolhe estar fora de jogo e que alegremente atua sem qualquer tipo de fiscalização ou valores éticos. Uma realidade que torna a atividade desleal para quem a pratica sob a crença de criar um serviço de valor para pessoas, que necessitam de ajuda com decisões imobiliárias, e parceiros sérios deste negócio.

Uma legislação mais forte, mais rigorosa e mais pedagógica criaria mediadores e agentes mais éticos, mais profissionais e mais sensíveis à necessidade de trabalhar para valorizar um mercado mais credível e de valor.

Sem grandes mitos ou fórmulas, estes são para mim os três pilares simples, mas que podem fazer grande diferença em Portugal, tornando-o um dos melhores mercados de mediação imobiliária no mundo.

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