Os direitos dos consumidores sofrem alterações em 2022 com a entrada em vigor do Decreto-lei nº84/2021, o qual resulta da transposição das diretivas europeias 2019/771 e 2019/770. A primeira, diz respeito à compra e venda de bens móveis e imóveis e, a segunda, é referente a contratos de fornecimento de conteúdos e serviços digitais.
Assim, com a chegada do novo ano, todos os consumidores, independentemente do país da União Europeia em que se encontrem, gozam dos mesmos direitos.
Com o aumento dos direitos dos consumidores, a responsabilidade dos vendedores também aumenta, quer seja em vendas físicas ou vendas online. A nova lei também determina as sanções a aplicar aos vendedores em caso de incumprimento da lei.
Os direitos do consumidor estão associados à falta de conformidade dos bens, garantia dos bens adquiridos e direitos de rejeição. Mas, afinal o que vai mudar afinal?
O que entende a lei por falta de conformidade
De uma forma simples podemos dizer que falta de conformidade diz respeito às características dos bens adquiridos, qualquer que seja o tipo do bem.
Nos termos da lei dos direitos do consumidor que agora entra em vigor considera-se que existe falta de conformidade do bem adquirido quando:
- O bem não apresente as qualidades de desempenho esperadas tendo em conta a descrição do mesmo na publicidade ou rótulo, nem tenha a qualidade e características do modelo na embalagem ou foi mostrado pelo vendedor;
- O bem não se adequa ao fim a que se destina;
- Não são entregues todos os acessórios, instruções de instalações ou similares;
- A instalação feita por profissionais ou segundo as instruções é incorreta.
Salienta-se ainda o facto de a falta de conformidade estar ligada ao direito de rejeição do bem (direito reforçado com a entrada da nova lei). O que muda então em cada tipo de bem?
Direitos do consumidor na aquisição de bens móveis
No que toca à aquisição de bens móveis são vários os novos direitos do consumidor. Seguem-se os pontos mais relevantes.
Aumento do prazo de garantia de 2 para 3 anos
O prazo de garantia inicia-se no dia em que recebe o bem. No caso de o trazer da loja, logo nesse dia, mas no caso de ser entregue em casa, só no dia que efetivamente o recebe.
A garantia dos bens móveis que era de 2 anos passa a ser de 3 anos a partir de 1 de janeiro de 2022.
Mas, note, esta garantia só se aplica a aquisições feitas em lojas físicas e online, mas não às que fizer a particulares. A menos que este lhe entregue o talão de compra na loja. Só assim pode beneficiar da garantia até ao final do prazo a contar desde a data de compra referida no talão.
Também não se aplica a bens vendidos por via de penhora, outra forma de execução judicial ou levada a cabo por uma autoridade pública.
Direito de rejeição (pode devolver no prazo de 30 dias)
Caso verifique qualquer das situações classificadas como falta de conformidade no prazo de 30 dias após ter o bem na sua posse (ou ter sido instalada por técnico da empresa vendedora) tem o direito de, sem necessidade de verificação de qualquer condição específica, pedir a substituição do bem ou devolver, recebendo o valor que pagou.
Deixou de existir prazo para denunciar o defeito após a sua constatação
Nos termos do art.º 4 da lei anterior (Decreto lei nº84/2008) tinha dois meses para acionar a garantia após a verificação do defeito. Com a entrada em vigor da nova lei este prazo deixou de existir. Deixam assim de existir obstáculos para o consumidor poder acionar a garantis do bem durante o prazo leal.
Neste caso, perante a avaria, pode exigir a reparação ou substituição do bem. Caso não seja possível, tem direito a pedir a redução do preço (proporcional ao defeito) ou a resolução do contrato.
Garantia aumenta 6 meses com a reparação do bem
Se o bem necessitar de ser reparado a garantia estende-se por um prazo adicional de 6 meses por cada reparação, mas com um limite máximo de 4 reparações.
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Fabricante tem de garantir peças durante 10 anos (depois do produto descontinuado)
Uma das grandes mudanças nos direitos do consumidor tem a ver com a existência de peças para reparação.
De facto, de forma a incentivar a reparação os produtos, a nova lei obriga o fabricante a disponibilizar peças para a reparação dos mesmos até 10 anos após ser retirado do mercado.
Os bens sujeitos a registo, como os automóveis, têm assim garantida assistência pós-venda pelo mesmo prazo.
Falharam data de entrega? Pode desistir da compra
Se quando comprou, por exemplo uma máquina de lavar, acordou uma data para a sua entrega e esta não aconteceu e por culpa do vendedor, ou se não for feita no prazo de 30 dias após a compra, pode desistir da aquisição, sem qualquer outra justificação.
Desistiu da compra? Tem de receber o valor no prazo de 14 dias
Desistir da compra, em termos legais, significa fazer a resolução do contrato. Esta implica que o vendedor lhe devolva, no prazo de 14 dias, a totalidade do valor que pagou pelo bem. Se falhar este prazo, tem direito à devolução em dobro do montante pago.
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Direitos do consumidor na aquisição de bens imóveis
A nova lei também estipula algumas mudanças no que toca aos direitos do consumidor na aquisição de imóveis
Aumento do prazo de garantia de 5 para 10 anos
Se comprar uma casa nova em 2022, saiba que a garantia sobre os seus elementos estruturais passa de 5 para 10 anos. Por elementos estruturais entende-se, de acordo com o Despacho Normativo de 9/2014, “as partes resistentes fundamentais da construção que suportam as ações a que a mesma está sujeita”. Ou seja, lajes, pilares, paredes, vigas e a cobertura do imóvel.
Para todos os outros mantem-se a garantia de 5 anos, nos termos do artigo 23.º do Decreto-lei nº 84/2021.
Por falta de conformidade pode desistir da compra
Se existir qualquer situação enquadrável em falta de conformidade, pode optar pela reparação do imóvel, substituição por outro equivalente do mesmo vendedor, pela redução proporcional do preço ou pela resolução do contrato.
Ao vender a sua casa a garantia é transmissível
Se vender a sua casa, ainda dentro do prazo de garantia de 10 anos, de acordo com a nova legislação esta e os demais direitos transmitem-se a quem comprar o imóvel ou a beneficiar dele gratuitamente.
Direitos do consumidor na aquisição de serviços digitais
A lei dos direitos do consumidor passa, a partir de 1 de janeiro de 2022, a abranger produtos que incorporem ou que estejam interligados com elementos digitais, como por exemplo, serviços de streaming ou de livros digitais.
Tal como no caso de bens móveis e imóveis, a responsabilidade, em caso de falta de conformidade, é atribuída a quem vendeu esse produto ou serviço.
Falta de conformidade tem termos adicionais
No caso destes serviços, especificamente, em termos de direitos do consumidores considera-se também existir falta de conformidade quando:
- não sejam asseguradas as atualizações, incluindo as de segurança, necessárias para colocar os bens em conformidade
- que as mesmas não sejam comunicadas e fornecidas ao consumidor, durante um período razoável tendo em conta o tipo e finalidade dos bens e dos elementos digitais
No entanto, tendo sido fornecidas as atualizações, se o cliente não as instalar num prazo razoável, o vendedor não é responsável por qualquer falta de conformidade que resulte desse facto.
Prazo de garantia depende do tipo de serviço
O prazo de garantia, ou seja, a responsabilidade pela não verificação da conformidade, depende do tipo de serviço adquirido pelo cliente.
No caso de contratos em que exista apenas um fornecimento, como por exemplo a compra de um e-book, vários fornecimentos individuais como a subscrição de publicações periódicas, a responsabilidade vigora durante dois anos.
Durante o primeiro ano, o cliente não tem a obrigação de provar que o defeito já existia quando recebeu o produto ou serviço. Ou seja, a presunção a favor do consumidor tem a duração de um ano.
No caso de contratos de fornecimento contínuo, o vendedor do serviço é responsável enquanto esse fornecimento durar. Neste caso, a presunção a favor do consumidor existe durante todo o período de fornecimento dos conteúdos ou serviços.
Cliente pode resolver o contrato se existir não conformidade
Caso exista qualquer situação considerada como falta de conformidade, o cliente deve pedir a sua substituição ou reposição. Se não for possível ou se a situação voltar a ocorrer, pode optar entre a redução proporcional do preço e a resolução do contrato.
Na resolução do contrato tem de ser reembolsado
Se optar por resolver o contrato, o fornecedor do serviço tem de o reembolsar, no prazo de 14 dias, de todos os valores pagos. Mas, atenção, pode ter de ter de devolver o suporte material no qual os conteúdos digitais foram fornecidos.
Alteração do serviço não pode ter custos
Nos contratos de fornecimento contínuo, como o streaming, os conteúdos ou serviços digitais podem ser alterados, mas só desde que a alteração não implique custos adicionais para si e se for informado da alteração.
Se as alterações tiverem um impacto negativo no acesso ou na utilização do serviço, nos termos dos novos direitos do consumidor, pode pedir a resolução do contrato.
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