O mundo do trabalho está a viver transformações profundas. A cada ano, novas tecnologias, mudanças demográficas, crises climáticas e instabilidades económicas levam à adaptação não só das empresas, mas também dos próprios profissionais. Neste cenário de constante reconfiguração, cresce o interesse por saber quais serão as profissões no futuro com maior potencial, que áreas vão liderar em empregabilidade e quais as competências que vão garantir uma carreira sólida e sustentável.
A resposta a estas perguntas pode ser encontrada no relatório “Future of Jobs 2025”, publicado pelo Fórum Económico Mundial, e no guia “10 Profissões de Futuro”, do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Estes dois documentos oferecem uma visão abrangente sobre os caminhos do emprego nos próximos anos.
Com base em mais de 1.000 empresas, que representam mais de 14 milhões de trabalhadores em 55 economias e 22 setores, o relatório internacional permite antecipar tendências com um elevado grau de detalhe. Já o documento português foca-se na realidade nacional, cruzando essas tendências globais com as necessidades do mercado português e a sua oferta formativa.
Mas para facilitar o acesso a esta informação, que consta em mais de 400 páginas, neste artigo resumimos os pontos essenciais destes dois documentos. Saiba o que está a mudar no mercado de trabalho, quais são as profissões do futuro e as áreas com maior empregabilidade até 2030, que competências vão ser essenciais e que profissões estão em risco de desaparecer. Fique ainda a conhecer o futuro do mercado de trabalho em Portugal.
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Um mercado em mutação acelerada
Os próximos anos (até 2030) vão ser marcados por uma “revolução laboral”. De acordo com o Fórum Económico Mundial, a combinação entre avanços tecnológicos, transição energética, tensões geopolíticas, envelhecimento populacional e reorganização das cadeias de valor vai provocar uma substituição ou desaparecimento de 22% dos empregos atuais. Em números concretos, isso significa que serão criados 170 milhões de novos empregos, ao mesmo tempo que 92 milhões deixarão de existir, resultando num crescimento líquido de 78 milhões de postos de trabalho.
No entanto, esta não é uma transição pacífica. A taxa de “instabilidade de competências” deverá atingir 39%, ou seja, dois em cada cinco trabalhadores terão de se reinventar profissionalmente. A boa notícia é que esse número já foi mais elevado. Em 2020, no início da pandemia, o índice chegou aos 57%. Essa descida reflete o aumento das iniciativas de reskilling e upskilling (requalificação e aperfeiçoamento), agora adotadas por 85% das empresas analisadas.
Dito isto, o futuro traz mudanças significativas. Mas, se as empresas e profissionais começarem a investir na requalificação, esta transição pode diminuir a taxa de desemprego futura.
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Profissões do futuro a nível mundial: Tecnologia, sustentabilidade, saúde e educação são as áreas de destaque
Não é novidade que as áreas da tecnologia, dados e inteligência artificial vão ter um impacto muito significativo no mundo do trabalho. No entanto, a empregabilidade também irá subir em áreas associadas à sustentabilidade, saúde e educação. A seguir, conheça as profissões que se vão destacar nestes setores.
Tecnologia, dados e inteligência artificial: Os novos motores da economia
Entre os fatores com maior impacto, a tecnologia continua a liderar. 86% dos empregadores esperam que a inteligência artificial (IA) e o processamento de dados transformem profundamente os seus negócios até 2030.
Em segundo lugar estão os sistemas autónomos e robótica (58%), seguidos pelas tecnologias de geração, armazenamento e distribuição de energia (41%).
Assim, emergem profissões ligadas ao desenvolvimento de software, análise de dados e cibersegurança. Os cargos com maior crescimento percentual até 2030 incluem:
- Especialistas em big data;
- Engenheiros de fintech;
- Especialistas em IA e machine learning;
- Analistas de cibersegurança;
- Desenvolvedores de aplicações e sistemas.
Estas funções estão a ganhar força não apenas nas grandes tecnológicas, mas também em setores tradicionais que adotam sistemas digitais, como a saúde, o ensino, os transportes e a energia.
Outro dado relevante: 70% das empresas planeiam contratar profissionais com novas competências tecnológicas nos próximos cinco anos. Já 40% pretendem reduzir o número de funcionários com competências obsoletas. Ou seja, há uma previsão clara: quem se adapta, irá prosperar no mercado de trabalho; já quem ficar estagnado, corre o risco de ficar desempregado ou de não conseguir manter ou encontrar um emprego.
Sustentabilidade e transição energética vão criar mais postos de emprego
A emergência climática não é apenas uma questão ambiental. É também uma questão económica. O relatório internacional destaca que 47% dos empregadores estão a investir na redução das suas emissões de carbono e 41% em estratégias de adaptação às mudanças climáticas. Isto está a criar uma nova geração de empregos verdes.
Entre as 15 profissões com crescimento mais rápido, três estão diretamente ligadas à transição energética:
- Engenheiros de energia renovável
- Engenheiros ambientais
- Especialistas em veículos elétricos e autónomos
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Empregos irão subir na saúde e educação
O envelhecimento da população é outro fator que molda as profissões no futuro. Até 2050, os países com rendimentos altos terão mais pessoas acima dos 65 anos do que jovens com menos de 15. Isso está a criar uma procura crescente por profissionais da “economia do cuidado“.
Segundo o relatório do Fórum, cargos como enfermeiros, auxiliares de apoio domiciliário, terapeutas ocupacionais e técnicos de gerontologia vão ter um crescimento sustentado.
O mesmo acontece no setor da educação, sobretudo em países com população jovem e em crescimento, como Índia, Nigéria e Indonésia.
Além disso, a saúde mental e o bem-estar dos trabalhadores também surgem como prioridade. 64% das empresas identificam o apoio à saúde dos colaboradores como estratégia para atrair talento. Este é um sinal de mudança na cultura corporativa.
Oportunidades em setores inesperados
Além dos setores óbvios, como tecnologia e saúde, há oportunidades noutras áreas menos faladas, como:
- Agricultura tecnológica (agritech): uso de drones, sensores e IA no campo;
- Cibersegurança e privacidade de dados;
- Gestão de resíduos e economia circular;
- Design de experiência do utilizador (UX/UI);
- Serviços de entrega e logística urbana.
Funções como condutores de entregas, operários agrícolas especializados e técnicos de processamento alimentar estão entre as que mais crescerão em volume absoluto, sobretudo em economias em desenvolvimento.
As competências mais procuradas até 2030
O estudo revela quais serão as skills mais valorizadas pelas empresas. Em primeiro lugar, surge o pensamento analítico (considerado essencial por 70% dos empregadores). Em seguida, vêm:
- Resiliência, flexibilidade e agilidade;
- Influência social e liderança;
- Curiosidade e aprendizagem contínua;
- Literacia digital e tecnológica;
- Capacidade de resolver problemas complexos.
Estas competências mostram que não basta dominar ferramentas técnicas. As soft skills e a capacidade de adaptação serão tão importantes quanto as qualificações formais.
A importância da formação contínua
Num mercado em mutação, a aprendizagem ao longo da vida passa de uma recomendação a uma necessidade urgente. 59 em cada 100 trabalhadores precisarão de formação até 2030. Destes, 29 podem ser requalificados nas suas funções atuais, 19 podem ser relocalizados noutras funções dentro da mesma empresa e 11 correm risco de exclusão do mercado por falta de atualização.
As empresas que mais investem em formação são também as que apresentam maior crescimento e inovação. Além disso, 83% já adotam políticas de diversidade e inclusão, o que amplia as oportunidades para grupos sub-representados.
As profissões que estão a desaparecer
Contudo, nem todas as tendências são positivas. Com a automatização e a digitalização, algumas profissões estão em declínio acentuado. As mais afetadas incluem:
- Empregados de caixa;
- Assistentes administrativos;
- Funcionários de correios;
- Operadores de introdução de dados;
- Secretários jurídicos.
Este declínio afeta, sobretudo, os empregos repetitivos e de baixa exigência técnica. As empresas identificam a digitalização e os sistemas de IA como principais causas dessa redução.
Em média, os trabalhadores nestes cargos têm menos acesso a formação contínua, o que agrava o risco de desemprego estrutural. Para inverter esta tendência, o investimento em formações intermédias, como os cursos de níveis 4 e 5, torna-se vital.
Profissões no futuro: 10 áreas de destaque em Portugal
Em Portugal, o IEFP identificou 10 áreas com alto potencial de empregabilidade e crescimento até 2030. Estas áreas estão diretamente alinhadas com as transformações digitais, ecológicas e sociais que marcam o mundo do trabalho. A seguir, exploramos cada uma dessas profissões.
Produção energética verde
A produção energética verde é uma das apostas mais seguras para quem procura um futuro profissional sustentável. Segundo o IEFP, esta área é estratégica não só pela sua relevância ambiental, mas também pela crescente adoção de fontes de energia renovável em Portugal.
Em 2021, 59% da energia consumida no país já provinha de fontes renováveis, e o Governo estabeleceu como meta atingir os 80% até 2026. Entre 2014 e 2018, este setor gerou mais de 41 mil empregos, e há forte expetativa de crescimento nos próximos anos, com destaque para a energia solar, eólica e hídrica.
Os profissionais desta área dedicam-se à instalação, manutenção e projeto de sistemas energéticos sustentáveis. As formações mais procuradas incluem técnico instalador de sistemas solares fotovoltaicos, técnico de sistemas térmicos de energias renováveis e técnico especialista em gestão e controlo de energia.
As competências necessárias envolvem eletricidade, termodinâmica, redes de energia, legislação ambiental e desenho técnico. Trata-se de profissões que aliam tecnologia, responsabilidade ambiental e elevada empregabilidade.
Eficiência energética
A eficiência energética assume-se como um eixo central na luta contra as alterações climáticas e no uso racional dos recursos. Em Portugal, o setor industrial é responsável por aproximadamente 35% do consumo energético total, o que revela o enorme potencial de otimização nesta área.
A implementação de políticas de eficiência energética já rendeu resultados visíveis: Portugal subiu 14 posições no ranking europeu entre 2015 e 2021, alcançando o 7.º lugar em termos de boas práticas. Este avanço reflete o investimento crescente em diagnósticos energéticos, modernização de equipamentos e implementação de soluções inteligentes.
Neste setor, os profissionais atuam na implementação de sistemas mais eficientes, na monitorização de consumos e na promoção da sustentabilidade energética em empresas, edifícios e instituições.
Entre os cursos destacados pelo IEFP estão o de técnico de redes elétricas, técnico de instalações elétricas e técnico especialista em Gestão e Controlo de Energia. As áreas do saber incluem eletricidade, produção e transporte de energia, química, metrologia e máquinas elétricas. A procura por especialistas nesta área deverá aumentar em todos os setores económicos, desde a construção civil até à indústria e administração pública.
Mobilidade elétrica
A mobilidade elétrica está no centro da transformação dos transportes em Portugal e no mundo. O IEFP destaca esta área como uma prioridade, tendo em conta a urgência de reduzir as emissões de carbono e tornar os sistemas de transporte mais sustentáveis.
Cidades como Lisboa e Porto já estão a implementar infraestruturas para carregamento de veículos elétricos e a apostar em transportes públicos com emissões reduzidas. Esta tendência está a gerar novas oportunidades de emprego e a exigir profissionais especializados na instalação, manutenção e gestão de sistemas de mobilidade elétrica.
Os perfis profissionais mais procurados incluem técnicos de mecatrónica, operadores de manutenção de veículos elétricos e especialistas em carregadores e baterias.
Os cursos recomendados pelo IEFP passam por áreas como Mecatrónica Automóvel, Eletrónica e Automação. As competências vão desde redes de energia, eletricidade e programação até sensores e sistemas de controlo. Além disso, a mobilidade elétrica está interligada com outras áreas emergentes, como as cidades inteligentes e a gestão energética.
Indústria 4.0
A quarta revolução industrial, conhecida como Indústria 4.0, está a transformar radicalmente o setor produtivo em Portugal. Esta nova era é marcada pela automatização, conectividade, inteligência artificial e análise de dados.
O IEFP reconhece que a Indústria 4.0 é um dos setores com maior crescimento potencial, e já está a investir na formação de técnicos intermédios com competências digitais e tecnológicas. O objetivo é preparar uma nova geração de profissionais capazes de lidar com fábricas inteligentes, produção digital e sistemas de controlo autónomos.
As profissões em destaque incluem operadores de robótica, programadores de sistemas industriais, especialistas em sensores e técnicos de automação.
A formação mais recomendada inclui cursos como os de técnico especialista em tecnologia mecatrónica e técnico de eletrónica, automação e comando. Estes profissionais devem ter conhecimentos sólidos em desenho técnico, eletromecânica, inteligência computacional, redes de comunicação e cibersegurança. É uma área com elevada procura por parte da indústria transformadora, nomeadamente nos setores automóvel, alimentar, farmacêutico e logístico.
Eletrónica
A eletrónica é uma área transversal e presente em quase todos os setores económicos, da saúde à engenharia, da energia à aviação. O IEFP identifica-a como uma área com grande capacidade de absorção de mão de obra qualificada, especialmente com a crescente digitalização da economia. A evolução dos dispositivos eletrónicos, a miniaturização dos circuitos e a integração com software de controlo criam uma procura constante por técnicos bem formados e atualizados.
Os cursos destacados pelo IEFP incluem técnico de eletrónica e técnico de sistemas digitais. Os profissionais desta área devem dominar circuitos, programação, análise de falhas e sistemas de teste.
As áreas de atuação vão desde a manutenção de equipamentos industriais até ao desenvolvimento de soluções eletrónicas personalizadas. A procura por estes profissionais deverá crescer sobretudo nas indústrias de telecomunicações, automação, tecnologia médica e energias renováveis.
Desenho assistido por computador (CAD)
O desenho assistido por computador, mais conhecido como CAD, é fundamental na conceção e fabrico de peças, produtos e infraestruturas. O IEFP destaca esta área como crítica para setores como engenharia civil, arquitetura, mecânica e design industrial.
A crescente complexidade dos projetos e a necessidade de otimização de processos exigem técnicos capazes de traduzir ideias em modelos tridimensionais precisos.
Os profissionais nesta área trabalham com software como AutoCAD, SolidWorks e Inventor, aplicando princípios de geometria, física e design técnico.
A formação recomendada inclui técnico de desenho CAD/CAM e técnico de projeto de construções mecânicas. A sua atuação estende-se a empresas de construção, fábricas de moldes, produção automóvel e indústria aeronáutica. A capacidade de interpretar normas técnicas e adaptar projetos em tempo real é um fator diferenciador.
Fresagem CNC
Se nunca ouviu falar em fresagem CNC (Controlo Numérico Computorizado), esta é uma técnica que permite produzir componentes metálicos com elevada precisão e complexidade. O IEFP considera esta uma profissão do futuro devido à crescente exigência de qualidade e personalização na indústria transformadora. A automação deste tipo de maquinaria permite responder com rapidez e eficiência às necessidades do mercado global.
Os técnicos de fresagem CNC são responsáveis por programar, operar e manter equipamentos que fabricam peças com tolerâncias mínimas.
Os cursos mais relevantes incluem técnico de maquinagem e técnico especialista em produção e transformação de metais. As áreas do saber envolvem mecânica dos materiais, leitura de desenho técnico, metrologia e informática industrial. É uma profissão com boas perspetivas de progressão salarial e que exige precisão, raciocínio espacial e domínio tecnológico.
Marketing digital e e-commerce
O marketing digital e o comércio eletrónico cresceram exponencialmente, impulsionados pela pandemia e pela transformação digital das empresas. O IEFP salienta que esta é uma das áreas com maior dinamismo no mercado nacional, graças à internacionalização dos negócios e ao aumento do consumo online. A procura por profissionais com competências em SEO (search engine optimization), campanhas pagas, redes sociais e análise de dados é crescente.
As formações recomendadas incluem técnico de marketing digital e técnico especialista em e-commerce. Os profissionais desta área trabalham com ferramentas como Google Analytics, Meta Ads, plataformas de gestão de conteúdo (CMS) e automação de marketing.
São ainda valorizadas competências em comunicação, criatividade, análise de dados e UX (experiência do utilizador). Com a tendência global de digitalização dos canais de venda, este setor continuará a crescer de forma sustentada.
Gestão de redes informáticas e web security
A segurança digital tornou-se uma prioridade num mundo cada vez mais conectado. O IEFP reconhece a cibersegurança como uma área crítica para empresas de todas as dimensões, sobretudo face ao aumento de ataques informáticos. A gestão de redes informáticas e a proteção de dados são funções que requerem técnicos altamente especializados e em constante atualização.
Entre as formações com maior saída estão técnico de redes informáticas, técnico de gestão de sistemas informáticos e técnico especialista em cibersegurança.
Estes profissionais planeiam, implementam e monitorizam infraestruturas digitais, assegurando o funcionamento seguro das redes empresariais. As competências vão desde protocolos de comunicação a firewalls, encriptação e deteção de intrusões. A procura por estes perfis deverá crescer tanto no setor privado como na administração pública.
Gerontologia e saúde
Por fim, a gerontologia e a saúde destacam-se como setores com forte expansão em Portugal, devido ao envelhecimento da população. Segundo o IEFP, o número de pessoas com mais de 65 anos irá aumentar significativamente até 2050, exigindo mais profissionais capacitados para prestar cuidados de saúde, acompanhamento social e promoção do envelhecimento ativo.
As formações mais relevantes incluem técnico auxiliar de saúde, técnico de geriatria e técnico especialista em gerontologia. Estes profissionais atuam em lares, hospitais, centros de dia e ao domicílio.
São valorizadas competências como empatia, ética, organização e conhecimentos técnicos em cuidados básicos de saúde. Esta é uma área com elevada empregabilidade e um impacto humano significativo, com oportunidades crescentes para jovens e adultos em requalificação.
O futuro começa agora
As profissões no futuro serão determinadas pela capacidade de adaptação, pelo domínio da tecnologia e pela aposta na sustentabilidade. Empresas, governos e trabalhadores precisam de agir de forma coordenada para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades desta nova era laboral.
Não se trata de prever o futuro, mas de construí-lo com base em dados, competências e decisões estratégicas. O futuro do trabalho já começou e está à espera de quem estiver preparado para o abraçar.
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